Prêmio Vladimir Herzog celebra mais um ano de luta do jornalismo pela democracia
Foto: Jorge Araújo / Fotos Públicas.
Por Kethilyn Mieza e Natasha Meneguelli
Com os jornalistas Juca Kfouri e Bianca Santana como mestres de cerimônia — arrancando risadas da plateia ao competir sobre quem improvisava ou chamava o próximo premiado primeiro — o 46º Prêmio Jornalístico Vladimir Herzog de Anistia e Direito Humanos emocionou ao trazer tributos marcantes sobre personagens da história da luta por democracia no Brasil. Para fortalecer a reverência, foi apresentado o documentário feito especialmente para a premiação sobre os três símbolos da resistência à ditadura (1964-1985) homenageados em 2024: Margarida Genevois, Ziraldo Alves Pinto, e Luiz Eduardo Merlino.
No início da celebração do dia 29 de outubro, no Tucarena, a abertura contou com a apresentação de uma publicidade pela paz, de Washington Olivetto. Um dos mais premiados publicitários brasileiros, Olivetto faleceu pouco mais de duas semanas antes da premiação, no dia 13 de outubro, aos 73 anos, no Rio de Janeiro.
O evento ainda comemorou os 15 anos de existência do Instituto Vladimir Herzog com direito a parabéns e bolo com velinhas no final. O público diverso, composto por jornalistas e estudantes de jornalismo de diferentes gerações e origens brasileiras distintas, participou ativamente de cada momento de comemoração, tanto na sua reação silenciosa quanto nos momentos em que aplaudia em pé.
Homenagens
“Eu tive esse pai, jornalista, desenhista, militante, corajoso, e do meu ponto de vista, totalmente irresponsável. E eu? E a Fabrícia? E o Antônio, de dois anos? E minha mãe, Dona Vilma? Você não pensava na gente? Poxa”, disse Daniela Thomas, filha mais velha do cartunista Ziraldo, sobre como ela via a ação política do pai, em texto lido em sua homenagem. “Pensava. Me dei conta, muitos anos depois. Ele não aguentaria que nós crescêssemos num país brutal, injusto, ignóbil como aquele. Era muito por nós, pelo nosso futuro, que a gente enfrentava, cotidianamente, os bárbaros. E sim, pai, eu entendi. E celebro essa tua luta aqui hoje, entre tantos como você, que nunca aceitaram se conformar com a injustiça”.
Daniela Thomas agradece a homenagem ao pai, cartunista Ziraldo. Foto: Jorge Araújo / Fotos Públicas.
No auditório circular, com palco no centro e os assentos dispostos em volta dele, era possível ver sorrisos, olhares marejados e expressões de orgulho dos presentes, que ouviam esta e outras declarações das famílias dos homenageados. Uma das características em comum entre os três nomeados foi a resistência à ditadura militar, instaurada pelo golpe de 1964 e que cumpriu 60 anos neste 2024:
Margarida Genevois, socióloga e primeira mulher a integrar, a convite do cardeal Paulo Evaristo Arns, a Comissão de Justiça e Paz, cujo objetivo era denunciar violações aos direitos humanos. Hoje, aos 102 anos, ela atua como presidente de honra da Comissão de Arns.
Ziraldo Alves Pinto, falecido em abril de 2024, conhecido como cartunista, chargista e escritor. Foi um dos fundadores de “O Pasquim”, jornal que utilizava o humor como forma de resistência durante o regime militar.
Luiz Eduardo Merlino, líder estudantil, jornalista e militante do Partido Operário Comunista (POC). Foi assassinado em 1971, após brutais sessões de tortura. Foi forjada pelos militares a versão de que ele teria se suicidado.
Além de suas histórias, o documentário também trouxe detalhes da origem da premiação, resgatando o símbolo da música “Opinião”, de Zé Ketti, carioca e um dos principais compositores brasileiros.
Premiados especiais
Foram também três os que receberam o Prêmio Especial Vladimir Herzog 2024. Primeiro, a jornalista Flávia Oliveira, colunista do jornal “O Globo” e comentarista da “GloboNews” e da “Rádio CBN”, premiada com um Esso em 2001 pela série de reportagens “Retratos do Rio”, e que atua, desde 2019, no podcast “Angu de Grilo”, com sua filha Isabela Reis, também jornalista.
“O reconhecimento a esse corpo e a essa voz, ou a essa escrita, pelas entidades organizadoras do prêmio especial Vladimir Herzog, a quem agradeço nesta década recém completada de jornalismo de opinião, me indica que acertei na escolha do meu caminho e no compromisso com ele”, disse Flávia durante seus agradecimentos, enquanto contava sua história de origem, na periferia do Rio. “Eu falei uma vez, anos atrás, sobre pessoas e grupos sociais que não arredam pé. Eu sou dessas pessoas, e desses grupos. Fui forjada também na persistência”.
Flávia Oliveira recebe diploma e troféu especial das mãos da presidente da Abraji, Kátia Brembatti. Foto: Jorge Araújo / Fotos Públicas.
Logo em seguida, foi a vez de Gisele Martins. Jornalista, comunicadora comunitária, pesquisadora e Maréense (autodenominação por ser cria da Maré, no Rio), integra a Coalizão de Mídias Periféricas, Faveladas, Quilombolas e Indígenas, e defendeu a atuação dos ativistas pelos direitos humanos no país. É também autora do livro “Militarização e censura - a luta por liberdade de expressão na Favela da Maré”, de 2019.
“Já recebi muitos prêmios e homenagens na minha vida, mas é o primeiro que me reconhece como jornalista”, pontuou Gisele durante o discurso. “Mas o jornalismo que também é comunitário e que tem lado, que defende a terra e o território, que defende a luta pela casa, pela água, que luta contra o racismo, a criminalização, a militarização. E que luta, principalmente, pelo direito à vida”.
Representando a Rede Wayuri de Comunicadores Indígenas do Rio Negro, Adelson Ribeiro, do povo Tukano, Josiane Pereira, do povo Baré, e Edson Gomes, diretor da Federação das Organizações Cienftíficas do Rio Negro, receberam a homenagem. O coletivo de mídia popular foi criado em 2017 e produz notícias semanais para as 750 comunidades indígenas demarcadas do Baixo ao Alto Rio Negro.
“Em um contexto de desafios socioambientais e ameaça aos direitos indígenas, a comunicação se torna uma ferramenta essencial para fortalecer a identidade, proteger territórios e garantir que as vozes indígenas sejam ouvidas”, reforçou Adelson enquanto agradecia o prêmio.
Foram 14 vencedores e contemplados com menção honrosa, que também estão listados no site do Prêmio Vladimir Herzog. Para aqueles que não puderam prestigiar a premiação presencialmente ou desejam reassistir os grandes momentos, a Cerimônia está disponível no Youtube, pelo canal da TV PUC.
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