A praga do ´´jabá´´
Poucos conhecem tão bem o mercado fonográfico brasileiro como o maestro Marcus Vinicius de Andrade. E poucos têm se manifestado tão frontalmente contra "a ação predatória" das gravadoras multinacionais nesse cenário como ele. Presidente da AMAR - Associação de Músicos, Arranjadores e Regentes, Marcus Vinicius integra o Comitê Ibero-americano da Confederação Internacional de Sociedades de Autores e Compositores (CISAC), e é o diretor-artístico do selo discográfico CPC-UMES.
A seguir, uma série de artigos que ele escreveu no ano passado denunciando o "jabá", prática recorrente das gravadoras Warner, Sony, Universal, BMG e Emi, que pagam para que suas gravações sejam executadas. A leitura desses textos é indispensável para quem quer entender melhor porque a boa música brasileira não toca nas rádios. Boa leitura!
A honra e o prazer
As indicações para o 2º Prêmio Tim de Música, divulgadas no dia 16 de junho, sugerem uma reflexão sobre a situação do mercado nacional, assolado pela ação predatória de cinco gravadoras multinacionais - Warner, Sony, Universal, BMG e Emi.
Das 102 indicações para premiação, elas obtiveram apenas 28 - 9 concentradas na categoria Pop/Rock. As 74 indicações restantes distribuíram-se por 26 gravadoras nacionais, incluindo a Som Livre, das Organizações Globo, que recebeu 4, e 5 produções independentes.
Não se pode dizer que o Prêmio Tim apresente critérios de seleção desfavoráveis às cinco irmãs. As 12 categorias são MPB, Pop/Rock, Samba, Canção Popular, Regional, Instrumental, Especiais, Melhor Canção, Arranjador, Revelação, Projeto Visual e Voto Popular. MPB e Samba, juntas, têm 24 indicações, 3 a menos que Pop/Rock e a curiosa categoria Canção Popular somadas. No item Especiais, há 3 indicações de CDs gravados em língua estrangeira. Não existe sequer, de forma individualizada, a categoria Choro, onde a produção das cinco multinacionais é nula.
O conglomerado Telecom Itália, também entusiasta dos métodos monopolistas, não iria cometer a imprevidência de aceitar que em seu nome fossem estabelecidos critérios para favorecer as gravadoras nacionais e a produção independente, contra seus pares.
Então, as perguntas que não querem calar são as seguintes: como essas cinco gravadoras conseguem ocupar 85% do espaço das emissoras de rádio e televisão, dedicado à música, e 85% do mercado de venda de CDs? Por que as gravadoras nacionais, apresentando uma produção comprovadamente diversificada e de qualidade, não passam de 15% e sem a Som Livre não chegam a 3% desses dois mercados que caminham em paralelo? A resposta cabe numa palavra: jabá.
Warner, Sony, Universal, BMG e Emi pagam para que suas gravações sejam executadas. E o que é pior: não pagam só para executar Zeca Pagodinho, Fundo de Quintal, Lulu Santos, Daniela Mercury, Caetano Veloso, Maria Rita, os trinta e poucos artistas que restaram em seus casts, cujo trabalho não prima pela vulgaridade. Pagam principalmente para executar o lixo, aquilo que nem a proverbial cara-de-pau que ostentam lhes permite apresentar a uma seleção como a do Prêmio Tim.
Além de se constituir numa forma acintosa de suborno, para o açambarcamento do espaço público da comunicação, o jabá é um modo de concorrência desleal contra as dezenas de gravadoras nacionais que mantêm a MPB viva. Por incrível que possa parecer, boa parte da verba gasta em jabá pelas cinco multinacionais vem de uma inexplicável isenção do ICMS que as favorece há vários anos.
A conseqüência dessa ação predatória contra o nosso mercado musical é que de 6º lugar no ranking mundial, já caímos para o 13º. Segundo dados fornecidos pela ABPD (Associação Brasileira de Produtores Discográficos), em 2002 foram vendidos 80 milhões de cds, contra 107 milhões em 1997. Responsabilizar os piratas menores é fácil. O difícil, aos maiores, é eximir-se da parte que lhes cabe nesse descalabro.
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