´´Não existe arquitetura fora da questão urbana´´
Um passeio pela história de São Paulo a partir de sua arquitetura foi o que a palestra da historiadora Rosa Artigas proporcionou, no último sábado, aos participantes do curso "450 Pautas: Descobrir São Paulo, Descobrir-se Repórter". Professora da escola de arquitetura Escola da Cidade, Rosa Artigas afirma que "não existe arquitetura fora da questão urbana".
Incomodada com o que chama de "vícios ideológicos", presentes nos festejos de 450 anos da "cidade que a todos acolhe de braços abertos e onde todos têm chance de vencer", Artigas diz que basta ir à periferia para ver que não é
verdade que a cidade abriu os braços indistintamente para quem aqui chegou em busca de oportunidades.
Ana Luisa Gomes, diretora da OBORÉ e Rosa Artigas
Para ela, a história de São Paulo, desde a colonização, está vinculada à expansão da economia capitalista em que foi estabelecida uma relação promíscua entre o espaço público e o privado. "Espaço não é só o ambiente físico, mas o espaço político que se configura no espaço urbano".
Rosa Artigas discorreu sobre o plano de modernização de São Paulo, no começo do século XX, que teve na figura de Ramos de Azevedo o seu principal empreendedor. Segundo ela, o arquiteto era, acima de tudo, "um empresário capitalista com visão". Artigas defende que houve, então, um esforço das elites paulistanas em eliminar, nos espaços urbanos, qualquer vínculo com o passado de origem negra e mameluca.
A professora chama a atenção para o fato que Ramos de Azevedo financiava as obras para o Estado, depois cobrava o investimento. "Existe até hoje uma profunda confusão, um limite muito tênue do que é o espaço público e o privado".
A modernização da cidade, com a construção das grandes avenidas e dos museus, empurra os mais pobres para as áreas periféricas, à beira dos Rios, enquanto a elite econômica, empenhada nessas iniciativas, vai se estabelecendo na região da avenida Paulista. De acordo com Artigas, é importante notar que ao longo da história de São Paulo a elite econômica e o Estado se fundem na mesma coisa.
Era JK: presença do Estado nos espaços físicos é maior
Existem, no entanto, dois momentos em que a presença do Estado é mais nitidamente percebida no espaço físico: logo após a Revolução de 32 e no governo de Juscelino Kubitschek. "Há uma expansão da área pública que culmina simbolicamente com a construção de Brasília, uma cidade de caráter público. O governo JK é um período onde há um arrefecimento dessa promiscuidade entre o público e privado, mesmo aqui em São Paulo, com Carvalho Pinto, a presença do Estado enquanto espaço físico começa a acontecer em vários lugares". Essa presença no espaço urbano se traduz nos equipamentos públicos existentes na cidade: a escola, o Fórum, o posto policial, as avenidas, o transporte, o ponto de ônibus.
Na ditadura militar há um grande investimento em equipamentos urbanos e uma tendência mundial de reformulação dos centros urbanos. "É um momento de abandono dos centros históricos das cidades e a criação de novos pólos urbanos, fora dos centros históricos. É uma tendência mundial, que acontece após o movimento de 68 na França. E sempre que surge um movimento social muito forte resulta numa defesa da burguesia em relação aos seus espaços urbanos e privados".
De acordo com Artigas, o Estado autoritário é um Estado planejador que funciona com planos econômicos e urbanos pré-estabelecidos. É nesse período que, por exemplo, começa a ser construído o metrô e o Banco Nacional de Habitação (BNH), que virá a ser o principal elemento de incentivo à construção civil e à especulação imobiliária atendendo, particularmente, a classe média. Nesse momento é que começam a surgir os bairros de classe média e a verticalização da cidade.
Anos